Cognição e
envelhecimento
As pesquisas sobre cognição
apresentam um dos registros mais longos e produtivos na psicologia do
envelhecimento (Schaie, 1990; Siegler, 1980).
Estudo longitudinal de Seattle (Willis e
Schaie,1986)
Os estudos revelaram um alto grau
de regularidade no funcionamento intelectual ao longo dos anos da idade adulta.
As capacidades cristalizadas ou
conhecimento adquirido no curso do processo de socialização tendem a permanecer
estáveis durante a vida adulta. As capacidades fluidas (envolvidas na solução
de problemas novos) tendem a declinar gradualmente, da juventude até a velhice.
As doenças exercem efeitos
profundos sobre o funcionamento intelectual.
Efeitos do treinamento
cognitivo:
Um grupo de sujeitos, com idade
média de 72,8 anos (faixa de 64-95 anos) foi classificado como “estável” ou
como “em declínio” ao longo de um período de 14 anos, em medições de raciocínio
indutivo e orientação espacial.
Estudo longitudinal de Seattle
(Willis e Schaie,1986)
Efeitos do treinamento
cognitivo:
Dos 107 sujeitos:
46,7% estavam estáveis
31% haviam declinado em uma
medição
21,8% declinaram em ambas as
medições.
Foi criado um programa para
oferecer treinamento na capacidade que havia apresentado declínio.
Tanto o grupo estável quanto
aquele em declínio beneficiaram-se igual e significativamente do treinamento.
O grupo de indivíduos em
declínio retornou aos seus níveis originais, enquanto o estável melhorou além
de seus níveis originais de desempenho.
Esses resultados indicam
claramente que o treinamento voltado para tarefas complexas pode ser efetivo
até mesmo para pessoas muito idosas.
A implicação desses achados é
que um indivíduo idoso, muito além da idade da aposentadoria, pode ter a opção
de permanecer na força de trabalho, se quiser, e pode obter um treinamento
apropriado.
Estudo longitudinal de Duke (1986)
Associação clara entre a saúde
física mais frágil (por doença cardíaca ou demência) e o desempenho cognitivo
em declínio.
Não há associação clara entre
saúde mental em declínio (depressão) e o desempenho cognitivo.
Funções mentais e envelhecimento
Memória
Inteligência
Vontade
Senso-percepção
Atenção
Consciência e esquema corporal
Pensamento
Linguagem
Afetividade
Dificuldade em se fixar a data
exata para o início do processo de envelhecimento psicológico e só teoricamente
pode ser delimitado
Diferença entre envelhecimento
fisiológico (senescência) e envelhecimento patológico (senilidade)
... na prática a fronteira entre
senescência e senilidade é imprecisa a ponto de Bourlière afirmar:
“A senilidade não é senão o
desembocadouro final dos processos da senescência”.
(Vargas, 1994)
1819 – primeiros estudos sobre
alterações psicológicas durante o envelhecimento (Burdach):
- os velhos apresentavam
diminuição da habilidade em assimilar conceitos novos e de comportamento
eficiente frente a inusitadas e diferentes situações
Funções mentais e envelhecimento
As funções mentais e o estado
fisiológico de órgãos e aparelhos quando perturbados obrigam o idoso a
constante adaptação.
Todas as transformações dessas
funções ligadas ao envelhecimento atingem a personalidade em seu todo e somente
podem ser avaliadas distinta e particularmente, sendo difícil agrupá-las, ainda
que estatisticamente.
(Vargas, 1994)
Os primeiros estudos da
Psicologia Involutiva colocaram em evidência os traços negativos do processo de
envelhecimento e foram dominados pela análise da memória e da inteligência.
Posteriormente, ganhou
importância a avaliação das demais funções.
(Vargas, 1994)
Memória
Conceito – “É um conjunto de
atividades que integram processos biofisiológicos, assim como psicológicos, os
quais não se podem produzir atualmente senão porque certos acontecimentos
anteriores, próximos ou distantes no tempo, modificaram, de maneira
persistente, o estado do organismo”.
G. Oléron
Composição da memória segundo Karl Jaspers (1911)
A capacidade de fixação
(ou de notação), isto é, a capacidade de trazer material novo ao reservatório
mnêmico, aqui distinguindo-se entre capacidade de aprendizagem (apresentação
repetida do material) e capacidade de fixação em sentido mais estrito
(apresentação única).
A memória, ou seja, o
grande reservatório de disponibilidades permanentes, capazes de vir à
consciência em ocasiões apropriadas.
A capacidade de reprodução,
vale dizer, aquela que consiste, a dado momento, segundo as circunstâncias, em
trazer da memória à consciência certo material.
Memória no idoso
As capacidades de fixação e
evocação, consideradas como atos psíquicos, podem estar alteradas ou não,
dependendo das condições individuais.
A síntese e as variações do RNA
aumentam no homem até os 40 anos, mantêm-se nesse nível por 15 a 20 anos e aos
60 começam a diminuir.
Envelhecimento no nível dos
ribossomas que reduz a memória
Redução dopaminérgica e
noradrenérgica, com manutenção dos níveis serotonérgicos
Leis que regem o envelhecimento da memória, segundo Ribot (1916)
As lembranças recentes
desaparecem antes das antigas.
Na perda da memória há um recuo
no passado que se opera progressiva e uniformemente.
Noções complexas são esquecidas
em primeiro lugar.
A marcha involutiva da memória
caminha do instável para o estável, das noções abstratas para as concretas.
Memória e envelhecimento
Em modelos experimentais os mecanismos da memória a longo prazo
(consolidação e busca da memória) parecem mais comprometidos do que aqueles
ligados à aprendizagem (Gold e MacCaugh, 1975).
Algumas das modificações
comportamentais presentes nos indivíduos idosos podem depender de alterações
dos sistemas hormonais e da neurotransmissão central responsável pela modulação
das funções mnésicas.
(Scapagnini, 1986)
“A capacidade de registrar uma experiência
geralmente não está prejudicada, exceto nas demências mais severas. A retenção,
por outro lado, pode ser bloqueada tanto por angústia psíquica como por
disfunção cerebral. Ausência de retenção é especialmente relevante aos dados
insignificantes freqüentemente levantados em um exame mental...” (Dan Blazer, 1992).
Os distúrbios de lembrança podem
ser testados diretamente de inúmeras formas. As mais comuns são testes de
orientação para tempo, lugar, pessoa e situação (...) Alguns idosos podem estar
isolados por prejuízo sensorial ou isolamento social, e, portanto, uma
orientação deficiente representaria mais o ambiente físico e social do que
disfunção cerebral. (Dan Blazer, 1992).
Algumas pesquisas têm
demonstrado que a memória recente para números é pouco afetada nas pessoas
idosas, enquanto a habilidade de reter e recordar algum conhecimento e
experiência recentemente adquiridos sofre grande prejuízo
A fixação e a conservação das
lembranças submete-se a duas condições específicas:
condições fisiológicas: a
capacidade de fixar e de conservar as lembranças depende de determinadas
condições orgãnicas, que são variáveis de indivíduo para indivíduo. Em geral,
as crianças, dotadas de uma grande plasticidade orgânica, fixam mais facilmente
as lembranças do que os velhos. Se não conservam uma tenciadde igual, isto
advém sobretudo da falta de certas condições psicológicas (atenção e
organização lógica, principalmente), que compensam no adulto a inferioridade
dos meios orgânicos. Todavia, quando as impressões sensíveis têm uma
intensidade especial, as lembranças são fixadas e conservadas pelas crianças,
com uma notável tenacidade: é o que explica o fato de que o velho possa evocar
com uma exata fidelidade as lembranças relativas a sua infância, enquanto que
não é capaz de fixar e de conservar as lembranças dos acontecimento recentes...
a) Também a influência do estado
físico geral: a fadiga, a debilidade nervosa prejudicam mais ou menos a aptidão
de fixar e conservar as lembranças;
b) condições psicológicas: são
poucas as faculdades a que se posssa melhorar o funcionamento como se faz com a
memória, de modo que as condições psicológicas são muito mais importantes.
Estas condições podem ser reduzidas a duas principais: a intensidade: uma
lembrança se fixa e se consrva tanto mais facilmente quanto seja mais viva a
impressão. É esta condição que se procura satisfazer pela atenção e repetição;
a oraganização das idéias: as idéias e os sentimentos se fixam e se conservam
tanto melhor quanto estejam ligados uns aos outros de maneira mais lógica. É
por isso que a intervenção da inteligência na organização das lembranças é um
fator importante de sua conservação (Régis Jolivet,)
Peculiaridades do comportamento afetivo do
idoso
O comportamento do idoso depende
mais do que em qualquer idade das motivações e significados pessoais que recebe
mais profundamente
Mesmo que o idoso tenha
conservado sua saúde física e psíquica em bom estado, a imposição de uma
aposentadoria ou a percepção de uma marginalização social pode imprimir-lhe uma
decadência afetiva próxima à depressão quando o idoso sofre uma
enfermidade física, a vivência desta pode influenciar seu tônus afetivo e tanto
a enfermidade quanto esse tônus afetivo poderão ser permanentes, ao contrário
do jovem onde a enfermidade como a reação afetiva serão passageiras, como
estranhas ao seu corpo e a sua personalidade.
As conseqüências do
envelhecimento das estruturas do sistema nervoso são sentidas rapidamente na
disfunção do sistema vegetativo e neuro-hormonais que modulam as respostas
emocionais.
Conforme a teoria de Cummings do
desligamento ou desprendimento social, sobressai a indiferença por laços
afetivos, que podem chegar a ser mínimos ou nulos. O idoso volta-se para si
mesmo, reduz o alcance de seu interesse pelo meio que o circunda e em
conseqüência perde a sensibilidade afetiva e muitos antigos impulsos não lhe
são mais motivadores.
A associação de uma deterioração
neurológica, de etiologia vascular-cerebral sobretudo, faz constatar uma
indiferença afetiva com incontinência emotiva ou labilidade afetiva em
situações impensáveis, que pode chegar a atingir um matiz infantil.
Poitrenaud assinala que, com a idade
as modificações afetivas e caracteriais são menos fáceis de auto-apreciar,
auto-perceber do que as mudanças na esfera cognitiva.
As modificações afetivas mais
frequentes são observadas nos neuróticos, com suas queixas hipocondríacas que
com a ansiedade acompanham as mudanças de caráter e de comportamento. Um
acontecimento sem importância, uma mudança no meio amabiente pode motivar uma
reação afetiva, com predominância de solidão, porém nem sempre relacionada à
situação real de isolamento.
O comportamento afetivo e a
resposta ou controle da emoção são expoentes da capacidade de reação de um
idoso, assim como a situação de suas reservas físicas e do grau de equilíbrio
de sua personalidade através de sua expressividade psicológica.
As reações afetivas muito
intensas em um indivíduo idoso podem acarretar importantes prejuízos, ao haver
perdido a adaptação rápida ou flexibilidade social ante a impactos emocionais,
a que são vulneráveis os idosos, que em
sua evolução podem desencadear crises, quer de situações de tensão muito
prolongadas ou fortes, podem precipitar o começo de uma patologia, a que sem
dúvida estão predispostos.
O indivíduo em processo
involutivo, quase como regra geral, é muito emotivo mas pouco afetivo.
Neuropsicologia e envelhecimento
A literatura psicométrica e
neuropsicológica apóia a noção de um maior declínio nas funções do hemisfério
direito, comparadas com as do hemisfério esquerdo (Albert e Kaplan, 1980; Lisz,
1978; apud Siegler et al., 1999).
Entretanto, experimentos
laboratoriais controlados revelaram poucas ou nenhuma diferença etária (Borod e
Goodglass, 1980, Nebes et al., 1983).
Permanece, entretanto, a questão
acerca de se existe um declínio diferencial no processamento espacial com o
aumento da idade.
Será que o prejuízo observado é
um resultado de declínio diferencial biologicamente determinado no hemisfério
direito ou será que esse declínio é devido a um problema de uso diferencial das
funções do hemisfério direito, comparado com o hemisfério esquerdo, ao longo do
período de vida ?
Testes do funcionamento do
hemisfério direito nem sempre predizem problemas do cotidiano espacialmente
relacionados.
Em um estudo que examinou a
eficiência de trajetos para compras dentro de supermercados verificou-se que as
capacidades psicométricas de um indivíduo, não importando o grupo etário,
pareciam ser previsoras mais pobres da eficiência nas compras (Kirasic, 1989).
Estudos neurocomportamentais
para avaliar as diferenças entre mudanças normais da idade e os efeitos das
doenças:
Avaliação longitudinal
Verificação neuropatológica
Neuroimagem
Os estudos das alterações
cognitivas têm se concentrado sobre a memória, intelecto e atenção.
Baterias de testes neuropsicológicos
evidenciaram pouco declínio generalizado na função cognitiva antes dos 80 anos.
Declínios significativos eram
vistos na memória visual de curto prazo, aprendizagem de dígitos em série e
reconhecimento facial.
As funções de construção, velocidade
do processamento de informações e processamento perceptual não verbal são
vulneráveis ao envelhecimento.
Estudos com o WAIS, WAIS-R
revelaram declínio seletivo no desempenho não-verbal e estabilidade relativa
nas capacidades verbais com o avanço da idade.
Hipóteses aventadas para esses
achados:
Mudanças degenerativas
associadas
com a idade são lateralizadas
para o
hemisfério direito.
Lesões no hemisfério direito
produzem uma discrepância entre o desempenho verbal e não-verbal similar àquela
vista em indivíduos que envelhecem (Benton, 1994; Lezak, 1983).
Hipóteses aventadas para esses achados:
Outros autores, entretanto, não
concordam e observam que os estudos
neuroanatômicos e de neuroimagem de adultos idosos normais não
demonstram uma deterioração preferencial das estruturas do hemisfério direito.
Muitos investigadores apontam
que os subtestes não-verbais do WAIS/WAIS-R, usados como evidência de função do
hemisfério direito, são confundidos por seu uso da velocidade de respostas, não
os tornando adequados para comparações de integridade entre hemisfério
direito e esquerdo (Mittenberg et al.,
1989).
Modelo de Cattel: inteligência
“fluida” e “cristalizada”:
As capacidades intelectuais
fluidas (capacidade para a solução
efetiva de novos
problemas) são afetadas pelo
envelhecimento. As capacidades cristalizadas (informações superaprendidas, há muito
mantidas, geralmente de natureza verbal) são estáveis durante esse período de
vida.
Dois estudos, entretanto,
baseados em análise fatorial de avaliações neuropsicológicas sugerem que outros
fatores podem explicar melhor as mudanças relacionadas à idade no desempenho,
como a velocidade do processamento de informações.
Estudos da psicologia cognitiva
revelam que nenhuma lateralização hemisférica é prevista pelos modelos de
prejuízo na inteligência fluida ou de velocidade do processamento de
informações.
Os processos cognitivos como
solução de novos problemas, atenção e integração perceptual-motora têm sido
atribuidos na literatura neuropsicológica à função do lobo frontal
(Benton, 1994; Lezak, 1983).
Evidências convergentes da
neuropsicologia e da psicologia cognitiva:
o envelhecimento normal envolve
declínios específicos no neocórtex do lobo frontal e estruturas cerebrais
subcorticais interconectadas.
Mudanças neuropsicológicas
relatadas no dano ao lobo frontal têm sido observadas no envelhecimento normal.
Outras alterações cognitivas
(esquecimento rápido) tipicamente associadas com doença de Alzheimer e
disfunção do lobo temporal medial não são típicas do envelhecimento normal.
Investigadores têm relatado
reduções pronunciadas no fluxo sangüíneo e no volume do lobo frontal em
populações idosas, enquanto outros relatam atrofia cerebral generalizada e
diminuições no fluxo sangüíneo cerebral.
Desmielinização das estruturas
cerebrais subcorticais periventriculares também é comum no envelhecimento e
está associada com sinais de prejuízos no lobo frontal no exame
neuropsicológico.
Estudos histopatológicos mostram
declínio seletivo do lobo frontal no
cérebro que envelhece.
A perda celular mais
significativa é identificada nos giros
temporais frontal
superior, pré-central e
superior.
Conclusões dos estudos da psicologia
cognitiva sobre o envelhecimento
Não mais perguntamos se as
pessoas idosas podem aprender, mas em vez disso indagamos:
“Qual é o meio mais efetivo de
ensinar às pessoas idosas as coisas que desejamos que aprendam?”
Conclusões dos estudos da
psicologia cognitiva sobre o envelhecimento
As capacidades de aprendizagem
das pessoas mais velhas são maiores e mais plásticas do que se pensava
anteriormente.
Há uma associação entre a competência cotidiana
(avaliada como independência em atividades da vida diária) e saúde tanto física
quanto mental.
(Willis, 1991).
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