O TRANSTORNO
BIPOLAR DO HUMOR
Orientação para pacientes, familiares e
amigos
Introdução
Os
conceitos de depressão e mania existem há séculos, e Hipócrates já havia
descrito pacientes com melancolia, atribuindo-lhes causa biológica.
Entretanto, somente a partir do século XIX ficou claro que depressão e mania
representavam dois estágios de uma mesma doença.
Até
o início dos anos oitenta, o transtorno do humor (ou afetivo) bipolar era
conhecido como psicose maníaco-depressiva, mas, a partir dos anos setenta,
foram estudadas também formas mais leves de euforia, como a hipomania. Com
isso, o termo psicose, que denotava maior gravidade, deixou de ser apropriado
para a maioria dos pacientes.
A
última edição da Classificação Internacional das Doenças, realizada pela
Organização Mundial da Saúde e publicada em português em 1993, foi fruto de
investigações realizadas no mundo todo, adaptou-se mais à realidade clínica dos
pacientes e possibilitou o diagnóstico de depressões e euforias com gravidade
variável.
Chamamos
de bipolares tipo I os pacientes que tiveram, pelo menos, uma fase de mania ou
estado misto e de bipolares tipo II aqueles que, ao longo da vida, tiveram
apenas hipomania, ou seja, euforias leves.
Apesar
de a doença maníaco-depressiva ser conhecida há muitos anos, a falta de um
tratamento eficaz facilitava a confusão do diagnóstico com esquizofrenia e,
geralmente, levava à internação. O surgimento de tranqüilizantes potentes e de
sais de lítio trouxe novo alento. Pacientes que tinham acesso ao tratamento preventivo
com lítio geralmente deixavam de ser reinternados. Foi ocorrendo uma gradativa
descentralização do tratamento hospitalar para o ambulatorial. permitindo
auxiliar pacientes com formas mais leves de euforia e depressão, antes pouco
vistos ou diagnosticados como "neuróticos" .
O
aprimoramento do diagnóstico e o aparecimento de novos medicamentos
impulsionaram a pesquisa sobre os transtornos do humor, principalmente na
década de noventa. Conhecer melhor o diagnóstico, as causas e o tratamento
permite aos pacientes a oportunidade de restaurar sua própria vida, na família,
com os amigos, no trabalho e nos estudos.
O
que são transtornos do humor?
Transtornos
do humor (ou afetivos) são enfermidades em que existe uma alteração do humor,
da energia (ânimo) e do jeito de sentir, pensar e comportarse. Acontecem como
crises únicas ou cíclicas, oscilando ao longo da vida. Podem ser episódios de
depressão ou de mania. Na depressão, a pessoa sente tristeza exagerada e
desânimo e, na mania, um aumento da energia e euforia anormal. A maioria dos
pacientes sofre apenas de depressão(ões) e alguns também têm manias. O termo mania
não significa "mania de fazer alguma coisa" ou algum tique - é
simplesmente o nome que o médico dá para a fase de euforia da doença maníaco-depressiva.
Às vezes, surgem sintomas depressivos e maníacos simultanearnente, os chamados
estados mistos.
Os
sintomas de euforia e depressão podem variar de um paciente a outro e no mesmo
paciente, ao longo do tempo, muitas vezes confundindo-o e seus familiares.
O que
significa bipolar ?
Os transtornos do humor podem acontecer ao longo da
vida dentro de um curso uni polar ou bipolar. No unipolar, só
ocorrem depressões e, no bipolar, depressão e mania. Pacientes que só têm
manias são raros e contam como bipolares, porque costumam desenvolver depressão
mais cedo ou mais tarde.
Que
tipos de transtornos do humor existem ?
Os
transtornos do humor podem ter freqüência, gravidade e duração variáveis.
Portanto, a depressão pode ser única ou recorrente (repetir-se várias vezes),
de intensidade leve, moderada ou grave, e durar semanas, meses ou anos. Se os
sintomas persistirem por anos, são chamadas de crônicas. Se for leve ou
moderada, a pessoa ainda consegue realizar suas atividades com esforço, algo
impossível se ela for grave. A maioria das pessoas que sofre de depressão não
acha que está doente porque não está gravemente deprimida, ou seja,
incapacitada, desesperada ou angustiada. A distimia é um tipo de transtorno do
humor com sintomas depressivos mais leves que os da depressão, porém duradouros
e oscilantes, em que predominam irritabilidade e mau humor. Freqüentemente é
confundida com a personalidade da pessoa e costuma evoluir para depressão.
Basta
uma única fase de hipomania ou mania, precedida ou não de qualquer tipo de
depressão acima mencionado, para diagnosticar transtorno do humor bipolar. Depois
da primeira (hipo)mania, geralmente se alternam depressões e euforias de
intensidade variável. Existem quatro tipos de transtorno bipolar. Se houve,
pelo menos, um período de mania ou estado misto, é bipolar tipo I; quando só
aconteceram hipomanias - crises de euforia mais leves que mania - bipolar tipo
11. O estado misto caracteriza-se pela superposição ou alternância em um mesmo
dia de sintomas depressivos e eufóricos importantes. Na ciclotimia, alternam-se
durante anos sintomas de depressão e de euforia ainda mais leves, que duram
apenas alguns dias. Pode ser confundida com um jeito de ser
"instável", "cheio de altos e baixos" e freqüentemente
antecede sintomas depressivos e eufóricos mais graves.
Se a
depressão, a mania ou o estado misto estiverem acompanhados de alucinações (sentir,
ver ou ouvir algo que não existe! ou delírios (pensar algo irreal, como
achar-se culpado de coisas que não fez, que está sendo perseguido, que possui
poderes especiais, etc.), trata-se do subtipo psicótico.
O
transtorno do humor bipolar também pode ser chamado de transtorno afetivo
bipolar ou doença maníaco-depressiva.
Qual a freqüência
dos transtornos do humor e quem corre maior risco ?
Os
transtornos do humor atingem mais de 20% da população ern algum momento da
vida. As depressões são duas vezes mais comuns em mulheres que em homens,
iniciam-se, em geral, entre 20 e 40 anos de idade e vitimam 16% a 18% das
pessoas. Transtornos do humor bipolares tipo I atingem igualmente 1 % a 2% dos
homens e mulheres e começam geralmente entre 15 e 30 anos de idade. Cerca de 5%
da população pode desenvolver a forma bipolar tipo li, mais comum em rnulheres.
Apesar de infreqüentes, os transtornos do humor atingem crianças, com sintomas
ansiosos e irritabilidade predominantes.
Quais são as causas do transtorno bipolar
do humor ?
Desconhecem-se
as causas exatas do transtorno bipolar, mas, aparentemente, o fator genético é
determinante. Existe uma interação complexa entre fatores ambientais e internos
com graus variáveis de vulnerabilidade genética. Inúmeros estresses podem
desencadear ou mesmo manter as primeiras crises. Dificuldades financeiras,
doença na família, perda de uma pessoa importante, uso de drogas, de inibidores
de apetite, parto, etc. podem desencadear a doença em pessoas predispostas.
Parentes
de primeiro grau de pacientes com transtorno bipolar do humor podern ter
diferentes tipos de transtornos do humor: unipolar, bipolar tipo I ou II,
ciclotimia ou distirnia.
É
muito comum a pessoa atribuir a acontecimentos importantes, a problemas
financeiros, profissionais ou sociofamiliares as razões para entrar em
depressão ou (hipo)mania. É mais comum ainda que ao menos parte desses problemas
seja conseqüência dos sintomas iniciais da doença, que se agravam a partir daí.
Quais são os sintomas da depressão ?
Na
depressão, a pessoa fica com o hurnor para baixo, sente-se triste, apática,
angustiada, ansiosa. Cai o nível de energia, aparecem o desânimo e a
dificuldade em sentir prazer na vida como antes, inclusive sexual. Ocorre uma
lentificação psíquica e física, paradoxalmente associada a desassossego quando
a ansiedade for intensa. Fica difícil concentrar-se, a memória falha, o
raciocínio não flui mais. A mente é invadida por um onda de pessimismo, de
idéias e de preocupações negativas. Surgem sentimentos de culpa, insegurança,
medo, inutilidade, solidão, burrice, inadequação, fracasso, baixa autoestima e
falta de sentido. Tudo é avaliado dentro de uma visão negativa distorcida:
passado, presente e futuro. Podem aparecer pensamentos de morte e alucinações.
Ocorrem alterações de apetite e/ou peso. O tempo de sono pode aumentar ou
diminuir, mas o sono deixa de ser reparador. Freqüentemente há queixas de dores
e de mal-estarfísico, resultando em várias visitas médicas sem sucesso antes de
se diagnosticar depressão.
Como identificar alguém em depressão ?
A depressão geralmente passa despercebida, porque, para a
maioria das pessoas, é leve a moderada, comprometendo menos a capacidade da
pessoa. Geralmente, ela é sentida quando aparecem angústia, sofrimento psíquico
e muita ansiedade. É importante saber que q irritabilidade é um sintoma muito
comum e nunca representa uma característica de personalidade. Os sintomas mais
freqüentes são:
• humor
para baixo, tristeza, angústia ou sensação de vazio;
• irritabilidade,
desEspero;
• pouca ou
nenhuma capacidade de sentir prazer e alegria na vida;
• cansaço
mais fácil, desânimo, preguiça, falta de energia física e mental; . falta de
concentração, lentidão do faciocínio,
memória ruim;
• falta de vontade, falta de iniciativa e
interesse, apatia;
• pensamentos negativos repetidos amplificados,
pessimismo, idéias de culpa, fracasso,
inutilidade, falta de sentido na vida,
doença, morte (suicídio);
• sentimentos de insegurança, baixa
auto-estima, medo;
• interpretação distorcida e negativa do
presente, de fatos ocorridos no passado e no futuro;
• redução da libido e vontade de ter sexo;
• perda ou aumento de apetite e/ou peso;
• insônia ou dormir demais, sem se sentir
repousado;
• dores
ou sintomas físicos difusos, sofridos, que não se explicam por outras doenças:
dor de
cabeça, nas costas, no pescoço e nos ombros,
sintomas gastrointestinais, alterações
menstruais, queda de cabelo, dentre outros;
• em depressões graves, alucinações e/ou
delírios.
Para
fazer o diagnóstico, bastam sintomas dos três primeiros itens e, pelo menos,
dois dos demais.
Qual a diferença de uma tristeza normal ?
Sentimentos
de alegria, tristeza, "fossa", angústia ou luto fazem parte da vida.
O deprimido percebe a diferença entre uma tristeza normal, que já sentiu antes,
da tristeza da depressão, que significa sofrimento constante, que passa, mas
retoma sem aviso prévio. A angústia reativa, devido a problemas situacionais,
resolve-se com a solução das dificuldades. Quem tem uma depressão reativa
consegue resolver os problemas e não os torna maiores do que são. Se estiver
estressado ou muito cansado, vai aproveitar bem suas férias.
O
deprimido aumenta as suas dificuldades, tem uma sensação de incapacidade e não
consegue mais solucionar seus problemas - ou vê problemas onde não existem. O
deprimido complica sua vida, torna-se muito sensível a tudo e percebe
"patinar" em coisas anteriormente fáceis de resolver. Se sair de
férias para descansar, leva a depressão junto.
Como é a mania?
O
termo mania significa um estado mental alterado em que a pessoa se sente
eufórica, acelerada e/ou muito irritada, "pavio curto", podendo tomar-se
agressiva verbal e fisicamente. Ocorrem agitação ou inquietação, aumento da
energia e redução da necessidade de sono. Os pensamentos aceleram-se, aumenta a
quantidade de idéias, a pessoa não consegue falar tudo o que vem à mente ao
mesmo tempo. Não consegue manter a atenção em um único tema, começa a fazer
muitas coisas ao mesmo tempo e não consegue terminar, tudo se torna importante.
Tudo precisa acontecer imediatamente, há brigas e discussões. Os sentimentos
podem ser de alegria exagerada e grande euforia ou mesmo de agitação incômoda e
sofrida. Surgem autoconfiança e otimismo extremos, sensações de poder,
influência, capacidade, inteligência e riqueza. Ela pode ter alucinações e
achar-se imbuída de poderes ou dons especiais. Súbitos sentimentos de depressão
podem vir e logo desaparecer. Muitos planos vêm à mente, ocorrem gastos
excessivos, endividamentos, negócios irresponsáveis ou precipitados. Aumenta o
contato social, a pessoa fica desinibida, deixa de se comportar de acordo com
seu padrão. Na esfera sexual, aumenta a libido, a desinibição e o erotismo. Em
geral, falta autocrítica, porque a pessoa sequer percebe as mudanças ou não as
vê como algo ruim ou incompreensível.
Como na
depressão, nem todos os sintomas necessitam estar presentes para que o médico
faça o diagnóstico.
Como
identificar quando alguém está em
mania?
Em
geral, a mudança no comportamento é gradual, agravando-se rapidamente, mas pode
começar de um dia para o outro. Dura dias, semanas ou meses se não for tratada.
Normalmente, a pessoa encontra motivos para sentir-se tão animada e não percebe
a alteração dos pensamentos e sentimentos. A própria família e os amigos não
costumam atribuir a mudança do comportamento a sintomas de doença. Para isso, é
necessário serem informados. Dentre os sintomas mais importantes, temos:
• humor para cima, exaltação, alegria exagerada
e duradoura; irritabilidade (impaciência,
"pavio curto");
• agitação, inquietação física e mental;
• aumento da energia, da produtividade ou
começar muitas coisas e não conseguir terminar;
• pensamentos acelerados, tagarelice;
• achar que possui dons ou poderes especiais de
influência, grandeza e poder; . otimismo e
autoconfiança exagerados;
• aumento dos gastos, endividamentos;
• distração fácil: tudo desvia a atenção;
• maior contato social e desinibição,
comportamento inadequado e provocativo, agressividade
física e/ou verbal;
• erotização, aumento da atividade e
necessidade sexuais;
• insônia, redução da necessidade de sono;
• quando grave, ocorrem delírios e/ou
alucinações.
O que é hipomania?
Na hipomania, o grau de aceleração psíquica é menor
que na mania. É comum aparecer antes ou depois de uma depressão e durar alguns
dias. Os sintomas são os mesmos, de menor gravidade, e a pessoa não tem
sintomas psicóticos. O humor geralmente é irritável e a pessoa torna-se
provocativa (achando sempre que os outros a provocam). O aumento de energia
pode ser produtivo, mas a pessoa se dispersa mais e perde mais tempo com
detalhes. Pode ter menos necessidade de dormir, tornar-se exageradamente
otimista, segura de si, arrogante, enfim, sentir-se acima dos outros. Aumentam
as idéias, os planos, os gastos, a libido. Como na mania, a pessoa justifica
toda a alteração do comportamento atribuindo-a a circunstâncias da vida, mas,
por ser menos séria, freqüentemente não é diagnosticada.
Como é o
estado misto?
Como
o próprio nome diz, nessa situação ocorrem simultaneamente sintomas depressivos
e maníacos acentuados. A pessoa pode acordar em pleno sofrimento e lentidão
depressiva, ir melhorando e sentir-se progressivamente mais eufórica com o
passar do dia, ou o inverso. Também pode sentir-se muito agitada, acelerada,
fazendo gastos e, ao mesmo tempo, queixar-se de angústia, desesperança,
pessimismo e vontade de morrer, ou seja, sentir-se ao mesmo tempo exaltada e
deprimida. Freqüentemente ocorrem estados mistos na passagem de uma fase de.
(hipo)mania para depressão ou vice-versa.
Está
certo rotular as pessoas como maníaco - depressivas ?
Rótulos são dados a produtos. Pacientes recebem
diagnósticos médicos. Sem o diagnóstico correto, é impossível elaborar
estratégias de tratamento. Os sintomas que permitem diagnosticar o transtorno
bipolar do humor são os mesmos, independentemente de raça, cultura ou classe social.
Eles se diferenciam da vida psíquica normal, alterando a forma de sentir,
pensar e agir. Obviamente estão inseridos na vida da pessoa, mas não devem ser
confundidos com características de personalidade nem justificados somente por
circunstâncias existenciais. Profissionais treinados na clínica psiquiátrica
são habilitados para diagnosticar, respeitando o que cada indivíduo possui de
único.
O que
acontece se não tratar?
Existe
a possibilidade de os sintomas melhorarem sem qualquer tratamento após semanas,
meses ou anos. Mesmo antes de haver medicamentos eficazes, sabia-se que o
paciente podia ter apenas um episódio de depressão na vida, com anos de
remissão, antes de se reiniciarem os sintomas, ou apresentar episódios anuais
ou intervalos de tempo cada vez menores alternados com períodos de doença cada
vez maiores ao longo do tempo. É importante saber que, com tratamento, o estado
maníaco ou depressivo passa mais rápido, sem deixar seqüelas.
Pessoas
que sofrem de transtorno bipolar levam em média oito anos antes para serem
diagnosticadas e/ou receberem tratamento adequado. Nesse período, os pacientes
tiveram sofrimento físico e psíquico imensurável e podem ter acumulado perdas
irreversíveis nos relacionamentos afetivos, nos estudos e no trabalho. Isso significa
separações, repetência, incapacidade de adquirir uma profissão, perda do
emprego, invalidez precoce ou mesmo morte.
Na
depressão, tudo se torna difícil e custoso: estudar, trabalhar, conviver com as
pessoas. Comprometem-se relacionamentos afetivos, na família, com o cônjuge ou
com colegas e amigos. Para atenuar o sofrimento, muitos se tornam usuários de
tranqüilizantes, álcool ou drogas. Além das perdas já mencionadas, a pessoa
pode correr risco de vida por negligenciar cuidados com a saúde ou por suicídio.
Durante
a mania, a pessoa sente-se ótima e não consegue avaliar as conseqüências da
irritabilidade, da desinibição e da sociabilidade na esfera pessoal. Atitudes
tomadas durante a (hipo)mania podem resultar em rompimentos conjugais, com
familiares e com amigos ou em ruína financeira e endividamentos. Há risco de
adultério, de gravidez indesejada, de contrair doenças sexualmente
transmissíveis. Os pacientes podem perder o emprego, arruinar sua reputação,
passar a abusar de álcool e/ou drogas. A combinação com o álcool é desastrosa,
pelo risco de acidentes, de violência e de problemas com a polícia.
Como tratar alguém com transtorno bipolar ?
O aparecimento do transtorno bipolar deve-se a uma
combinação de fatores, em que aspectos biopsicossociais desempenham papel
importante no desencadeamento da doença. Assim sendo, tratamentos
medicamentosos, orientações sobre a doença e orientação psicológica estão
indicados. O segredo está no encontro da combinação ideal para cada paciente.
Orientação
psicoeducacional
Se o remédio não for tomado, de nada adianta receitá-lo.
Para aumentar o sucesso do tratamento, é preciso esclarecer ao paciente e aos
familiares sobre os sintomas da doença, suas causas, como ela pode seguir
durante a vida da pessoa, quais os riscos, que atitudes tomar durante a
depressão e na mania, como se preparar para as recorrências e assim por diante.
Alguns aspectos são fundamentais. Em primeiro lugar, será tratado o diagnóstico
de transtorno bipolar, não apenas sintomas depressivos ou eufóricos,
levando em consideração que a doença é para a vida toda, podendo hibernar por
meses ou anos, o tratamento deve ser planejado para atender as necessidades a
curto, médio e longo prazos.
Na
orientação acerca da doença, também deve ser abordado o preconceito. Resolver
dúvidas ajuda a diminuí-lo, mas só o tempo poderá eliminá-lo de vez.
Infelizmente, pacientes e familiares sofrem durante anos, acumulando
ressentimentos, queda do poder aquisitivo e atraso na formação antes da
aceitação do diagnóstico e do tratamento.
Outra
questão a ser aprendida é como lidar com uma nova crise. Cuidar da decepção, da
frustração, da desesperança e, além disso, prevenir conseqüências prejudiciais
são fundamentais na recuperação.
Tratamento
medicamentoso
Existem
vários tipos de substâncias usadas no tratamento do transtorno bipolar,
dependendo do estado em que o paciente se encontra: estabilizadores do humor,
antidepressivos, antipsicóticos e tranqüilizantes. Para tratar uma crise de
depressão, pode ser necessário o uso de antidepressivos se os estabilizadores
do humor não forem suficientemente eficazes; em uma (hipo)mania, apenas
estabilizadores do humor podem resolver ou adicionam-se antipsicóticos e
tranqüilizantes. Esses são os tratamentos de fase aguda.
Quando
a pessoa já teve, pelo menos, três crises ou uma muito séria e tem o
diagnóstico de transtorno bipolar do humor, é aconselhável não adiar o tratamento
de manutenção, para evitar ou reduzir a gravidade de novos períodos de
doença. Os estabilizadores do humor podem bastar para controlar uma (hipo)mania
ou estado misto, mas são os remédios ideais para o tratamento de manutenção ou
preventivo de novos episódios do transtorno bipolar.
É
importante lembrar que, mesmo a curto prazo, o efeito dos medicamentos na
depressão, na (hipo)mania ou no estado misto leva, pelo menos, duas a quatro
semanas para ser significativo. A melhora completa pode levar alguns meses e,
depois disso, é necessário manter as medicações usadas na fase aguda da doença
por mais algumas semanas ou meses, dependendo da gravidade. Depois de melhorar
por completo, não apenas parcialmente, o paciente segue para a fase de
manutenção.
Nessa
fase, normalmente a pessoa sente-se bem e corre o risco de descuidar do rigor
no tratamento medicamentoso. Da mesma maneira como acontece na hipertensão
arterial ou no diabetes, a pessoa sente-se bem por estar tomando remédios. Ela
não pode parar sem o consentimento do médico achando que está curada.
Felizmente
dispomos, hoje em dia, de vários remédios que podem controlar o transtorno
bipolar do humor, de tal modo que, se a pessoa não puder tomar algum deles ou
não se beneficiar o suficiente, é possível trocá-los ou fazer combinações entre
eles. Serão mencionados somente os disponíveis no Brasil.
Estabilizadores
do humor são os remédios mais importantes e devem ser usados a partir do
diagnóstico de transtorno bipolar. Controlam o processo de ciclagem de um
episódio a outro, reduzindo a quantidade de depressões e (hipo)manias e a
gravidade delas. Variam entre si no efeito antidepressivo e antimaníaco. Os
mais estudados e bem conhecidos são o carbonato de lítio, a carbamazepina e o
ácido valpróico. Com exceção do lítio, todos eles são também usados como
anticonvulsivantes (remédios para tratar epilepsia).
• lítio (Carbolitium@, Litiocar@, Carbolim @)
• carbamazepina (Tegretol@)
• oxcarbazepina (Trileptal@)
• ácido valpróico (Depakene@)
• lamotrigina (Lamictal@)
• gabapentina (Neurontin@)
• topiramato (Topamax@)
Antidepressivos
são o tratamento indicado para as depressões. No paciente com transtorno do
humor bipolar, o médico primeiro introduz o estabilizador do humor e, se não
melhorar, associa um antidepressivo. Essa cautela reduz o risco de ciclagem
para euforia que os antidepressivos podem desencadear. Se isso acontecer,
demorará mais para controlar a doença a longo prazo.
.
Tricíclicos e heterocíclicos
. por exemplo,
Tofranil®, Anafranil®, Tryptanol®, Pamelor®,
Ludiomil®.
.
Inibidores da monoaminoxidase (lMAOs)
. por exemplo,
Parnate®, Stelapar®, Aurorix®
. Inibidores
seletivos de recaptação de serotonina (lSRS)
. por exemplo,
Prozac®, Cipramil®, Aropax®, Zoloft®,
Luvox®.
. Novos
antidepressivos
. por exemplo,
Efexor®, Remeron®, Stablon®,.Prolift®,
Wellbutrin®, Ixel®, Lexapro®
Antipsicóticos
são medicamentos de efeito antimaníaco e antipsicótico. Podem ser
usados durante um episódio de depressão, mania ou estado misto se houver
sintomas psicóticos.
.
De primeira geração
. por exemplo,
Haldol®, Amplictil®, Stelazine®, Neuleptil®,
Melleril® Navane®.
. Novos
antipsicóticos
. por exemplo,
Risperdal®, Leponex®, Zyprexa®, Seroquel®,
Geodon®, Abilify®.
Tranqüilizantes
representam substâncias com ação
hipnótica ou tranqüilizante, que devem ser usados temporariamente, enquanto os
estabilizadores do humor não fizerem efeito.
. por exemplo,
Valium®, Rivotril®, Lorax®, Lexotan®,
Stilnox®, Frontal®, Olcadil®.
Eletroconvulsoterapia
(ECT)
A
ECT é um dos tratamentos antidepressivos e antimaníacos mais eficazes indicado
nos extremos da mania e da depressão, para prevenir exaustão ou suicídio, pelo
rápido tempo de ação. Inclui aplicar pequenas correntes de energia durante
rápida aplicação de anestesia geral, para obter uma convulsão de alguns
segundos de duração. Jamais deve ser considerado tratamento de última escolha,
prolongando inutilmente o sofrimento pela falta de melhora com os medicamentos.
É o mais seguro em gestantes e idosos e pode salvar a vida do paciente.
Tratamentos
psicológicos
O tratamento medicamentoso é básico, mas o transtorno
bipolar não é meramente um problema bioquímica, mas também psicológico e
social. Entrar em contato com os sintomas do transtorno bipolar causa
sofrimento e pode ser traumatizante para o paciente e para a família. O medo de
como isso vai afetar sua vida, o preconceito e a aceitação do diagnóstico
requerem atenção psicológica. Para aceitar, é necessário conhecer a doença a
ponto de diferenciar seus pensamentos e sentimentos e tomar decisões baseadas
em conhecimento e não em emoções, como medo ou raiva da doença. Tratamentos
psicológicos procuram fornecer boas informações, orientação e motivação em um
ambiente de apoio e confidencial.
Há
vários tipos, dependendo da necessidade específica de cada paciente, como
psicoterapias individual ou grupal. terapia familiar ou conjugal e orientação
psicoeducacional, como mencionado anteriormente.
Durante
o curso do tratamento, o paciente costuma enfrentar recorrências, pois o,
manejo medicamentoso pode demorar até ser acertado. Tais experiências trazem
desapontamento, dúvidas sobre o tratamento, sentimentos de culpa e de revolta.
Na psicoterapia e na orientação sobre a doença, é possível encontrar
esclarecimento e apoio necessários para superar cada -novo obstáculo que a
doença impõe.
Problemas
que comprometem o resultado terapêutico
A magnitude das conseqüências depende da combinação de uma
série de fatores: idade de início (quanto mais cedo, mais compromete os estudos
e a formação profissional), gravidade dos sintomas, quantidade de episódios,
tratamento adequado, aceitação do tratamento, apoio familiar, associação com
alcoolismo ou abuso de drogas (o que praticamente impossibilita o tratamento),
associação com outras doenças, características de personalidade (fragilidade,
imaturidade, dependência) e problemas persistentes considerados sérios pela
pessoa.
Antes de mais nada, é necessário conhecer a doença e
o tratamento do transtorno bipolar do humor. Mesmo assim, cada novo episódio
representa um desafio, porque se misturam problemas individuais, questões
pendentes e características de cada família.
O
apoio ao tratamento é fundamental para ajudar o paciente em momentos difíceis a
manter os medicamentos na dose certa e no horário prescrito. Bastam alguns dias
sem tomar a medicação ou tomando menos que o necessário para que entre em nova
crise. Compreemj_rps sintomas não COJi!10 seu jeito de ser, mas como doença,
alivia muito eJeduz o sentimento de culpa do deprimido. O doente em euforia
requer' firmeza e paciência, porque o relacionamento se torna mais desgastante.
Ele pode recusar as orientações da família, alegando que agora toda vez que se
sentir feliz e de bem com a vida logo pensam que está em mania. A intervenção
junto ao médico antes que o paciente perca a autocrítica previne conseqüências
piores ou eventual internação.
• Se
os medicamentos estiverem causando efeitos colaterais muito incômodos e o
paciente
mencionar
que quer parar com tudo isso, o médico deve ser informado.
• Detectar com o paciente os primeiros sinais
de uma recaída; se ele considerar como
intromissão, afirmar que é seu papel
auxiliá-Io.
• Falar com o médico em caso de suspeita de
idéias de suicídio e desesperança.
• Compartilhar com outros membros da família o
cuidado com o paciente.
• Estabelecer algumas regras de proteção
durante fases de normalidade do humor, como
retenção de cheques e cartões de crédito em
fase de mania; auxiliar a manter boa higiene de
sono;
programar atividades antecipadamente.
• Mesmo depois da melhora, há um período de
adaptação e de desapontamento; é importante
não exigir demais e não superproteger;
auxiliá-Io a fazer algumas coisas quando necessário.
• Evitar chamar o paciente de louco ou
demonstrar outros sinais de preconceito, que favorecem
o abandono do tratamento; tratá-I o
normalmente e apontar sintomas com carinho.
• Aproveitar
períodos de equilíbrio para diferenciar depressão e euforia de sentimentos
normais de
tristeza e alegria.
Como o
paciente pode ajudar-se?
A
pessoa mais interessada no próprio bem-estar é quem está doente. O paciente com
transtorno bipolar do humor tem uma doença que costuma durar a vida toda. que
se mantém sob controle com tratamento adequado. Cabe a ele o esforço de manter
o tratamento: é ele quem toma os medicamentos ou não. Ninguém
pode forçá-lo. a não ser em situações que ponham em risco a sua segurança ou a
de outros. Portanto, se você é portador do transtorno bipolar:
• comprometa-se com o tratamento - discuta
dúvidas com seu médico,
eficácia dos estabilizadores do humor, intolerância
a efeitos colaterais, etc.;
• mantenha uma rotina de sono; mudanças no sono
ou redução do tempo total de sono podem
desestabilizar a
doença; converse com seu médico, caso precise mudar o hábito de dormir;
• evite álcool e drogas: além de interagirem
com algumas medicações, também agem no
cérebro, aumentando o risco de
desestabilização da doença; se tiver insônia ou inquietação.
não se automedique - converse com seu
médico;
• evite
outras substâncias que possam causar oscilações no seu humor, como café em
excesso,
drinques, antigripais, antialérgicos ou
analgésicos - eles podem ser o estopim de novo
episódio da doença;
• enfrente os sintomas sem preconceito -
discuta com seu médico sobre ele;
• se não estiver podendo trabalhar, "não
queime o filme" - é mais sensato tirar uma licença.
conversar com a
família ou com o patrão e permitir-se convalescer;
• lembre-se: você está bem por tomar a
medicação; se parar de tomá-Ia, mesmo após cinco ou
dez anos, os sintomas podem voltar sem
prévio aviso; é preciso manter-se alerta para o
aparecimento dos primeiros sinais, como
insônia e irritabilidade;
• há indícios de que quanto mais crises da
doença a pessoa tiver, mais ela continuará tendo,
por isso, procure participar ativamente do
tratamento;
• descubra seus sintomas iniciais de nova crise
depressiva ou maníaca
tome nota e avise imediatamente seu médico;
• aproveite períodos
de bem-estar para redescobrir como você de fato é; como são os
sentimentos de
tristeza, alegria, disposição e como você lida com seus problemas;
• quanto mais você conhecer a doença, melhor
você poderá controlar os sintomas no período
inicial; proteja-se: evite estímulos de
risco em potencial, como decisões importantes, relações
sexuais sem preservativos, projetos
ambiciosos, gastos - ponha seus planos no papel e espere
para executá-los quando se reequilibrar;
procure canalizar hiperatividade ou idéias negativas
para atividade física ou manual; se estiver
deprimido, dê-se um empurrão, pois a iniciativa
está em baixa;
• procure e aceite
ajuda da família e dos amigos quando perceber que não consegue se cuidar
sozinho;
• é comum
querer parar o tratamento, porque vai tudo bem ou porque não está dando certo;
procure conversar com outras pessoas com o
mesmo problema, que já passaram por isso;
lembre-se de como era seu sofrimento;
discuta com a família se valeria a pena buscar uma
segunda opinião sobre o diagnóstico e o
tratamento.
Temporariamente, o paciente pode ficar inapto a tratar-se
adequadamente. Nessas fases, a intervenção amiga da família é fundamental.
Há
quem considere que o transtorno bipolar do humor "é como um animal
selvagem em sua mente, pronto para escapar a qualquer momento" e que
precisa de grades fortes para ser contido. Às vezes, a porteira se abre um
pouco e ele volta a ameaçar - o importante é não deixá-lo à solta. A luta a ser
travada com esse animal é longa e difícil, mas vale a pena - vale o resgate da
própria vida.
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essas lutas com outros pacientes e familiares pode servir de exemplo e motivar
quem está a ponto de desistir de si mesmo. São bem vindas iniciativas como as
da Abrata (Associação Brasileira de Transtornos Afetivos), que auxilia no
amparo aos pacientes por meio da própria experiência com o transtorno afetivo
bipolar.
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