domingo, 29 de julho de 2012

Abuso de Substâncias no Idoso

Problemas no diagnóstico de abuso de substâncias no idoso

Por décadas acreditou-se que o abuso de subst. no idoso é rara o que agora é negado pelos fatos.
Pessoas com longo tempo de dependência a álcool e drogas morrem prematuramente.
Sintomas do abuso de subst. podem mimetizar outros transtornos médicos e comportamentais.
Os idosos tendem a não relatar problemas de bebidas e os clínicos estão menos propensos a anotar esses problemas e a fazer referências adequadas nessa população.
  (Booth et al. 1992; Curtis et al. 1989; McInnes e Powell 1994; Moos et al. 1993; in Atkinson, 2000.)

Termos usados no campo do abuso de substâncias químicas: Abuso

É um padrão desadaptado de uso de subst. que leva a comprometimento significativo ou angústia, manifestado por um ou mais dos seguintes que ocorreram num período de 12 meses:

   * Uso recorrente de subst. resultando no fracasso em cumprir as obrigações principais no trabalho ou em casa;

   * Uso recorrente de subst. em situações fisicamente perigosas

Manual Diagnóstico e Estatístico (DSM-IV) e CID-10)

   * Problemas legais recorrentes relacionados ao uso de substâncias.

   * Uso continuado de subst. apesar de ter problemas recorrentes ou persistentes ou problemas interpessoais causados ou exacerbados pelos efeitos de uma subst.

   * Refere-se a uma gravidade menor do que os casos de dependência.
Desejo intenso ou sentido de compulsão para tomar uma subst.
Dificuldades em controlar o comportamento da tomada de subst. quanto ao seu início, término ou níveis de uso.
Estado de abstinência fisiológica quando cessou o uso de uma subst.; ou uso da mesma subst. (ou relacionada proximamente) com a intenção de aliviar ou evitar os sintomas de abstinência.

Código Internacional de Doenças (Organização Mundial de Saúde) - CID-10

Evidência de tolerância, tal como aumento das doses da subst. psicoativa para se atingir os efeitos originalmente produzidos por doses menores (exemplos claros disso são encontrados em indivíduos dependentes de álcool e opiáceos que podem tomar doses diárias suficientes para incapacitar ou matar usuários não tolerantes.
Negligência progressiva de prazeres ou interesses alternativos  devido ao uso de substância psicoativa, quantidade aumentada de tempo necessário para obter a subst., ou para se recuperar de seus efeitos.  
Persistência no uso de subst. apesar da evidência clara de consequências prejudiciais, tais como lesões hepáticas devido a excesso de bebidas, estados de humor depressivo consequentes a períodos de uso pesado de subst., ou compromentimento das funções cognitivas relacionado a droga; devem ser desenvolvidos esforços para determinar se o usuário era realmente consciente da natureza e extensão do dano.

Fatores de risco para abuso de substância no idoso

Semelhantes aos da população em geral:
   - Sexo masculino
   - Pouca educação
   - Baixa renda
   - Histórico de outros transtornos Psiquiátricos

Fatores predisponentes:
   - História familiar (álcool)
   - Abuso prévio de substância
   - Padrão prévio de consumo de substância (efeitos individuais e de coorte)
   - Traços de personalidade (hipnóticos-sedativos e ansiolíticos)

Fatores que podem aumentar a exposição a substâncias e o nível de consumo:

    - Gênero (homem: álcool e drogas ilícitas,  mulheres: hipnóticos sedativos e
       ansiolíticos).
    - Doenças crônicas associadas com dor (analgésicos opióides), insônia (drogas
       hipnóticas), ou ansiedade (ansiolíticos).
    - Prescrição há longo tempo (hipnóticos-sedativos e ansiolíticos).
    - Uso elevado, produzido por cuidadores, de uma medicação necessária (idosos
       institucionalizados).
    - Estresse da vida, perdas, isolamento social.
    - Afetos negativos (depressão, luto, moral baixo e angústia) (álcool).
    - Desagregação familiar e parceiro que bebe (álcool).
    - Tempo sobrando ou dinheiro (álcool).

Fatores que podem aumentar os efeitos e o abuso potencial de substâncias:
    - Sensibilidade associada à idade (fatores farmacocinéticos e farmacodinâmicos)
    - Doenças clínicas crônicas.
    - Outras medicações (interações álcool-droga e droga-droga).

Epidemiologia
Há um declínio com a idade, mas persistem os problemas significativos de saúde pública.
Maior prevalência na faixa dos 25-45 anos.
Declina passo a passo a partir dos 55 anos.
Últimos 12 meses (Ruchlin, 1997):
                          46% - qualquer uso de álcool
                          30% - consumiram pelo menos 12 drinks
Os efeitos fisiopatológicos do álcool podem ter consequências mais sérias devido ao aumento da sensibilidade biológica para o mesmo e por que ele agrava doenças pré-existentes mais comuns na velhice.

Padrões de uso/abuso de álcool
Beber pesado X Problemas com bebida
Quando o idoso continua a beber apesar de não estar se sentindo bem ou de avisos para parar, ele preenche a definição de abuso no beber, mesmo quando tal beber não esteja associado com comportamento social desviante ou com a vontade para se sentir intoxicado.
A distinção entre beber pesado e problemas com a bebida se estreita com o avançar da idade.
A incidência de alcoolismo em idosos não é tão rara quanto se pensava antigamente.
A dependência secundária a transtorno do humor ou distúrbio mental orgânico hoje não se sustenta mais.
Casos de supostos alcoolistas tardios podem ser confundidos com alcoolistas precoces que tiveram longo período de abstinência.
Alguns bebedores idosos foram bebedores sociais, pesados ou reativos na juventude.
O alcoolismo é mais leve e mais circunscrito do que aqueles que começaram mais cedo.
Têm menos alcoolistas, menos quadros psicopatológicos, mais status sócio-econômico e maior proporção de mulheres entre os familiares.
                             (Atkinson, 1994; Liberto e Oslim, 1995)

Beber reativo: dados contraditórios entre diferentes autores:

Alguns alcoolistas idosos (pessoas com início tardio do alcoolismo, os que tiveram recaída tardia em alcoolismo precoce após anos de sobriedade, ou aqueles que tiveram um aumento recente da ingesta alcoólica no histórico de vida) relatam perdas importantes, tensões crônicas e complicações como precipitantes do aumento da bebida.
               (Finney e Moss, 1984; Welte e Mirand, 1995; in Atkinson, 2000)
Estudos comunitários de alcoolistas idosos revelam que o consumo elevado de álcool está mais relacionado com boa saúde física e financeira e a convivência com um(a) companheiro(a) do que com adversidades.
                (Barnes, 1979; Busby et al. 1988; Nakumra et al. 1990; in Atkinson, 2000)
Desde que um padrão de beber excessivo foi estabelecido afetos negativos (depressão, tristeza, tédio, angústia, tensão) podem disparar  episódios de excessos mais do que afetos positivos (tranquilidade, alegria, simpatia). 
                                             (Dupree e Schonfeld, 1998; in Atkinson, 2000)
O reforço social para o beber pesado é evidente em alguns, mas nem todos os estabelecimentos institucionais.
                     (Adams e Cox, 1995; Alexander e Duff, 1998; Paganini-Hill et al. 1986)
Não existem evidências para afirmar que o alcoolismo tardio surja como reação aos estresses da vida e que o alcoolismo reativo seja maior do que na população mais jovem.
O alcoolismo tardio tende a ser resolvido mais frequentemente sem tratamento formal do que na população mais jovem.
        (Finlayson et al. 1988; Moos et al. 1991; Atkinson, 1995; Schonfeld e Dupree 1991)

Uso terapêutico do álcool
Os estudos não são conclusivos e demandam uma avaliação mais precisa.
O uso diário de uma dose de vinho tinto tem efeito anti-oxidante ?
O National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism recomenda que os idosos não ultrapassem uma dose diária padrão ou sete drinks por semana e não mais do que dois drinks em ocasiões de beber social.

Distúrbios mentais associados ao álcool
Distúrbios manifestados primariamente por estados mentais alterados
   ¨   - Intoxicação alcoólica
       - Intoxicação idiossincrática
       - Blackout alcoólico
Distúrbios manifestados primariamente por estados mentais alterados
   ¨  Síndrome de abstinência alcoólica
       - Abstinência alcoólica complicada (síndrome de tremores)
       - Alucinose alcoólica
       - Convulsões por abstinência alcoólica
       - Delirium por abstinência alcoólica (delirium tremens)
Distúrbios manifestados primariamente por estados mentais alterados
   ¨  Síndrome de Wernicke-Korsakoff
       - Encefalopatia de Wernicke
       - Distúrbio amnéstico alcoólico (psicose de Korsakoff)
   ¨  Outros distúrbios cognitivos relacionadosa neurotoxicidade pelo álcool
       - Demência alcoólica
       - Déficits cognitivos alcoólicos focais
   ¨   Insônia associada ao álcool
   ¨  Distúrbio do humor associado ao álcool

Distúrbios manifestados primariamente por achados neurológicos focais

   ¨   Polineuropatia alcoólica periférica
   ¨  Degeneração alcoólica cerebelar
   ¨   Distúrbio do movimento relacionado ao álcool (tipo Parkinson)

Distúrbios neurológicos raros associados a alcoolismo crônico

     ¨   Doença de Marchiava-Bignami
     ¨  Ambliopia nutricional
     ¨   Mielinose central pontina

Distúrbios associados a alcoolismo crônico mas não com neurotoxicidade alcoólica

     ¨   Encefalopatia hepática
     ¨  Degeneração hepatocerebral adquirida
     ¨   Trauma agudo induzido e hematoma sub-dural crônico

Comorbidade psiquiátrica em alcoolistas idosos
Tratamento
Hospitalização em caso de intoxicação aguda.
Em casos mais leves pode ser ambulatorial: abstinência (paciente altamente motivado para o tratamento).
Parada da ingesta de álcool.
Restauração do equilíbrio hidro-eletrolítico.
Administração de 500-1000 ml de solução salina normal.
Evitar o uso de soluções de glicose (o álcool é metabolizado como carbohidrato).
Suplementação com Vit. B parenteral.
Suplementação de magnésio (inj. IM profunda de 0,10-0,15 ml/kg).
Instituição de medicações com tolerância cruzada ao álcool (diazepam) – as doses devem ser tituladas durante as primeiras 24/48 horas.
Evitar o acréscimo de álcool ao trato. com benzodiazepínicos em trato. Ambulatorial.
No delirium o diazepam é o trato. de escolha.
Aumento nos problemas de memória, disartria e ataxia indicam intoxicação pela droga.
Abstinência em ambiente social baseado no apoio social e na ausência do uso da droga (centro de desintoxicação).

Tratamento a longo prazo

Profilaxia com dissulfiran (antabuse).
Intervenções terapêuticas na família.
Grupos de auto-ajuda (AA).
Apoio de membros da família e do clínico.
Mobilização de recursos para lidar com o problema:
    - ambiente social (estressores agudos e crônicos, recursos da rede social)
    - sistema de cuidados de saúde (disponibilidade de cuidados de saúde: intervenções   
      médicas, terapia comportamental e programas educacionais).

Alcoolismo no idoso e cognição
Envelhecimento e Neurotoxicidade Alcoólica
Generalidades
Embora lesões cerebrais alcoólicas decorram principalmente de carência tiamínica há evidências de que o álcool por si mesmo é potente neurotoxina, principalmente levando a dano cortical.

Existem evidências de sensibilidade do SNC aumentada para o álcool com o envelhecimento, mas diferentes para cada indivíduo.

A performance cognitiva está comprometida em bebedores sociais velhos, testados no estado sóbrio, mas somente em níveis elevados de consumo. (Parsons e Nixon 1998).

Fluxo sanguíneo cerebral está reduzido proporcionalmente ao nível de consumo relatado de álcool em indivíduos saudáveis. (Meyer et al. 1984)

Em grupos de pacientes de idades mistas com alcoolismo, mas sem transtorno amnéstico, a neurotoxicidade é evidenciada por numerosos déficits neuropsicológicos, por estudos de imagens cerebrais da atrofia do córtex cerebral, corpo caloso, hipocampo anterior, diencéfalo, núcleo caudado e partes do sistema límbico, incluindo o lobo temporal medial. (Parsons 1994;  Ryan e Butters 1986; Jernigan et al. 1991; Pfefferbaum et al 1992; Sullivan et al. 1995 Kril et al. 1997).

Idade, mais do que o tempo de duração do alcoolismo, é fundamental para o  aparecimento destes achados.

Alterações corticais refletem perdas de substância cinzenta e branca, a partir dos  50 anos de idade e se somam aos déficits próprios do envelhecimento.

Perdas mais importantes são em áreas frontais. Evidentes em estudos de PET-Scan em idosos alcoolistas, estudos de fluxo sanguíneo cerebral regional e potenciais evocados. (Kril e col., 1997; Pfefferbaum e col., 1997)

O padrão do comprometimento nas performances neuropsicológicas em pacientes com alcoolismo levantou a “hipótese do lobo frontal”:  solução de problemas, abstração, organização, julgamento e memória de trabalho          (Oscar-Berman e Hutner 1993) (Kril et al. 1997; Pfefferbaum et al. 1997)

Pesquisas recentes indicam lesões espalhadas pelo cérebro, além do lobo frontal, que explicam vários déficits de performances em pessoas com alcoolismo mas sem distúrbio amnéstico:

Déficits nas habilidades visuo-espaciais-motoras podem estar associadas a:

         perda tecidual no córtex parietal anterior ou dilatação;

         perda tecidual em estruturas diencefálicas  profundas e límbicas em pacientes não

          amnésicos, que poderiam ser a base primária para a disfunção cerebral.

Achados histopatológicos em idosos com alcoolismo incluem lesões e perda neuronal, redução das conexões dendríticas, particularmente no lobo frontal.

Perda neuronal, redução do corpo neuronal, perda ou redução das grandes células piramidais do córtex superior frontal.

Estas perdas também ocorrem durante o envelhecimento normal, o que sugere que o declínio relacionado com a idade  na integridade da estrutura cerebral, especialmente nos lobos frontais, reduz a margem de segurança e deixa o cérebro mais vulnerável à neurotoxicidade alcoólica.

Resolução dos Déficits Cognitivos
Após Retirada do Álcool

Cognição está afetada em indivíduos recentemente desintoxicados de álcool, mas os déficits são maiores em sujeitos idosos.

Resolução dos Déficits Cognitivos
Após Retirada do Álcool - I

Comprometimento após ingestão prolongada é multifatorial devido à:

            neurotoxicidade  crônica do álcool

            intoxicação alcoólica residual

            humor deprimido

            disfunção hepática e metabólica

            abstinência alcoólica, principalmente em idosos

            efeitos da medicação sedativa para tratar a abstinência

Os déficits podem ser focais ou em “colcha de retalhos”, ou ainda podem preencher critérios para o diagnóstico de demência.

O termo “deterioração cognitiva alcoólica reversível” foi proposto pois a demência permanente na maioria das vezes não acontece.

Avaliação clínica e neuropsicológica de 50 pessoas com mais de 60 anos, entre 1 a 6  meses após a última ingestão alcoólica,  revelou que 16% apresentavam déficits cognitivos focais e 6% preencheram critérios para demência.              (Atkinson e Tolson 1992)

A resolução de alguns déficits (habilidades psicomotoras e memória de curto prazo) pode ser evidenciada após 5 anos ou mais após a abstinência.  A memória de longo prazo tendeu a permanecer comprometida, mesmo após 7 anos de abstinência.

Estes achados evidenciam mecanismos diferentes de mediação para funções reversíveis e irreversíveis. (Ryan e Butters 1986)

Melhora correspondente na atrofia cortical foi demonstrada em RNM em série, bem como o fluxo sanguíneo cerebral,  em sujeitos idosos abstinentes.   (Carlen et al. 1986;  Ishikawa et al. 1986;  Muuronen et al. 1989; Pfefferbaum et al. 1995) 

Transtorno Amnéstico Persistente Induzido por Álcool

Deficiência relativamente severa de tiamina.
Maior risco para pessoas com deficiência genética de transcetolase.




Depressão no Idoso III

















Depressão no Idoso II